sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Os assaltos

Apesar de viver em São Paulo, cidade com um dos índices de criminalidade mais altos do Brasil, nunca tive uma arma apontada para a minha cabeça, e os poucos assaltos que sofri foram provavelmente uma completa perda de tempo para os ladrões.

Antigo morador do bairro de São Mateus - conhecido como um dos mais violentos da cidade - com cara de vitima por vocação (baixinho, gordinho, branquinho e com cara de tonto), eu convivi desde pequeno com o perigo iminente de sofrer um assalto. Porém, poucas vezes isso aconteceu, três, para ser mais exato.
Na primeira delas, eu voltava da padaria em um domingo à tarde. Tinha pedido dinheiro ao meu pai para comprar sorvete para mim e para os meus primos e na volta da padaria fui abordado por dois rapazes de 18 anos, que me abraçaram e vieram perguntando “Sabe onde mora o Manuel?” “Não sei”, respondi com um pouco de receio. “Não sabe onde mora o Manuel?” “Não, sério ‘veio’”, respondi, em uma parca tentativa de parecer mais malandro do que a minha aparência frágil e infanto-obesa sugeria. Antes da terminar de perguntar a terceira vez onde era a casa do Manuel, um deles me encostou na parede e falou “CADE O DINHEIRO?” Quase cagando nas calças eu respondi que tinha acabado de gastar na padaria compando os sorvetes. Para não sair de mãos abanando, acabaram levando dois Chicabons e até o meu Galak meio chupado.
Pelo menos, quando cheguei em casa meu pai deu mais dinheiro para comprar outros sorvetes, e foi comigo para evitar que a cena ridícula voltasse a acontecer.

Somente anos depois eu voltaria a ser abordado. Com cerca de 13 anos e pouca experiência com ônibus, acabei passando o ponto do shopping para o qual me encaminhava, afim de encontrar meu pai. Desci em uma parte mais escura, margeando um terreno baldio, margeando um muro alto, há mais ou menos 200 metros do shopping. No meio do caminho avistei dois homens, ambos aparentando entre 25 e trinta anos e razoavelmente bem vestidos (uma vez que estavam perto do shopping Aricanduva e ninguém por ali está mais bem vestido que “razoavelmente”). Por algum motivo pressenti que ia dar merda, então coloquei a touca da minha jaqueta na cabeça afim de parecer mais malandro e continuei caminhando. Mais uma vez traído pela minha forma obesa e baixinha, fui abordado pela dupla. “É um assalto!”, falaram e eu levantei o braço, achando que essa era uma resposta-padrão para a frase. “Abaixa o braço, ta louco?” Eu abaixei. “Cadê o celular?” Eu não tinha. “Cadê o relógio?” Eu não gostava de usar (aliás, não uso até hoje). “Dá a carteira!” Eu dei. Ele abriu, fuçou, revirou e então percebeu que eu não tinha um centavo. Só tinha pegado um passe de ônibus em casa para me encontrar com meu pai, ele iria pagar o Mcdonald´s” Para não dizer que saíram sem nada, os meliantes conseguiram subtrair cerca de 70 centavos do bolsinho de moedas da carteira, e me devolveram a carteira velha e rasgada, que eu praticamente peguei do lixo quando meu pai comprou uma nova pra ele.

A última e mais patética de todas aconteceu um dia durante a volta da escola. Tinha acabado de ganhar um boné novo do meu pai, da “Da Hui”, marca de Surf que era “da hora” na época. Descendo a rua que dava acesso à minha casa, passei por um grupo de adolescentes. Comecei a andar mais rápido, mas não muito, para não dar na cara que eu estava com medo. Eles começaram a andar mais rápido ainda e me abordaram. “Eae mano, da hora essa bombeta hein?”. Já com medo daquela conversa respondi “É, né?”. Em um surto de ironia ele perguntou. “Quer trocar pelo meu?” O objeto da troca em questão era um boné amarelo, daqueles de espuma, escrito “COVAS GOVERNADOR”. Óbvio que eu não queria trocar, e em um rompante de coragem falei “Não cara, valeu, esse aqui foi presente do meu pai, se eu trocar ele embaça”. Eis que o desgraçado fala ‘Ta bom, se não quer trocar, eu fico com os dois” e tirou o boné da minha cabeça.

Desci minha rua me sentindo humilhado por ter perdido o boné, um fraco por não ter oferecido o mínimo de resistência
E um burro, por não ter aceitado o boné do Covas.

3 comentários:

Monka! disse...

ADOREI!! rsrs
Estava com saudades dos seus textos amore!!
E tu devia ter aceito o boné do Covas, seria a melhor troca q já fez na vida hahahahahahaha

Te adoro! Saudadeeeee

Kah.. disse...

Antes um boné do Covas do que um do Lula!

lontra assassina disse...

haha, curti esse blog até tuitei tua histporia do medo das baratas!! hahaha. mas vc é daqueles que não costuma atualziar com frequencia né?