quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Sobre meninos e tartarugas

Lendo o texto sobre orientação vocacional no blog do Fábio, me dei conta de como vocação é uma coisa engraçada. No texto, ele escreve como sempre quis ser jornalista e que escolher a profissão que ia seguir nunca foi dúvida. Achei muito legal, porque sempre achei que deve ser muito bom crescer já sabendo seus objetivos e o que vai ter que fazer para alcançá-los. Diferente dele, eu nunca soube muito ao certo o que queria da vida e nem do que gostava. Lembro-me de uma vez, quando ainda era criança, conversar com o meu pai sobre estudar “oceanografia” e ele dizer que era muito legal, mas o mercado era pequeno. Eu não tinha idéia do que era “mercado”, apenas achei fantástica a foto utilizada na época pela universidade que oferecia o curso, que mostrava um mergulhador, um recife e uma tartaruga. Pra mim “oceanografia” era mergulhar com tartarugas. Quem ia me pagar pra fazer isso eu não tinha a mínima idéia e sinceramente não me importava. Já um pouco maior, me lembro de outras conversas com meu pai, onde ele me sugeria estudar direito, ser um juiz ou um advogado tributário, pois é uma profissão que dá muito dinheiro. Na época me pareceu fantástico, pois ser juiz pra mim significava poder prender os outros e embora não tivesse nem uma vaga idéia do que significava ser um “tributarista”, pelo nome eu já julgava uma coisa importante. Depois de um tempo, descobri que para ser um bom advogado, a pessoa precisa gostar de ler e saber escreve, o que me deixou muito frustrado, pois não gostava muito de ler e era péssimo nas aulas de gramática (A professora Maria Andrade que o diga!).

A época do vestibular chegou e eu ainda não tinha uma idéia certa do que queria fazer. Lembrava-me das conversas que tive com meu pai quando era mais garoto e apesar de ainda não saber escrever muito bem, eu já adorava ler e achava que isso bastava para me dar bem em direito. Com isso em mente, fiz o vestibular para o curso e comecei na universidade muito empolgado com o novo ambiente. Descobrir ser parcialmente verdadeira a lenda de que é preciso gostar de ler para estudar Direito. Na verdade, não é preciso gostar, é preciso ter paciência e atenção, pois não são leituras para se apreciar. Até ai tudo bem, sempre tive paciência para ler e realmente ia razoavelmente bem nas provas, mas depois de oito meses tive um primeiro estalo de que talvez estivesse indo para o lado errado. Na época ignorei, achava que era por conta do currículo puxado, aulas e leituras cansativas e por isso deixei de lado. As férias estavam chegando e eu teria tempo para descansar e voltaria com todo o gás.

Nesse meio tempo, comecei a trabalhar em um escritório de advocacia onde pude ver de perto qual é o dia-a-dia de um profissional de Direito. Foi um lugar onde aprendi muito e onde ainda trabalham pessoas que admiro muito pela inteligência e perfeccionismo. Porém, tanto no trabalho quanto na faculdade eu sempre percebi que não era e nem pensava como a maioria. Dentro de sala, eu tinha amizade apenas com apenas cinco pessoas, em uma sala de cento e vinte. Ao contrário da minha maneira de ser, a maioria era muito séria e reservada. No trabalho, eu era o único a esquecer de fazer a barba todo dia e ter que ser lembrado disso pelo chefe. Também era o único nesses lugares que achava que juízes não eram deuses e por isso não deveriam ser venerados como tal, coisa que eles adoram. Depois do primeiro semestre do segundo ano decidi que aquilo tinha que parar, pois não agüentaria a vida toda usando terno e gravata e fazendo a barba todo dia. Nesse ponto eu sabia o que eu não queria, o que era uma grande coisa, mas ainda não sabia o que queria, o que era um problema. Comecei então a pensar em qual profissão eu me daria bem, levando em consideração que eu gostava muito de ler e já escrevia razoavelmente bem, apesar de não gostar. Eu sabia que o tempo estava passando e que eu teria menos de um semestre para decidir, mas já havia perdido dois anos e não queria perder mais um. Pensei inclusive em parar por um ano e avaliar o que queria, mas isso também ficou fora de questão. Um dia conversando com meu primo, ele me contou que tinha muita vontade de fazer jornalismo, que achava muito legal e nesse momento tive um estalo: Jornalismo! é isso!
Daí pra frente foi convencer minha família de que isso era o que eu queria, pois todos diziam que esse é um mercado pequeno e difícil para um profissional se destacar, mas como na época da Oceanografia e da tartaruga, mais uma vez eu me peguei me lixando para o mercado. Eu queria estudar jornalismo e assim seria! Assim foi!

Comecei a três anos atrás e não lembro nem uma vez de ter me arrependido. Conheci pessoas maravilhosas, vivi coisas incríveis e cultivei uma extrema paixão por escrever, embora ainda não tenha uma extrema competência para tal. Somente duas lembranças me vêm à cabeça quando penso se estou no caminho certo: A primeira vez que vi uma matéria publicada com meu nome e a primeira vez que recebi uma credencial de imprensa. Nesses dois momentos eu tive que me segurar para não deixar cair nenhuma lágrima e ser chamado de veado pelos meus amigos do serviço, que achavam aquilo corriqueiro. Com o tempo eu também passei a achar cotidiano ver meu nome no expediente, publicar matérias assinadas por mim e receber credenciais de imprensa, mas como tudo na vida, na primeira vez foi especial. Tanto é, que ainda tenho guardada minha primeira credencial junto à minha carteira de motorista.
Essas coisas foram definitivamente importes para me mostrar que tomei o rumo certo, apesar do desvio. Porém, a coisa que mais me deixou mais feliz durante esses três anos que faço jornalismo, é não precisar fazer a barba todos os dias!

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